"Se você soubesse, de antemão, o quanto a prática ['espiritual', do zen] poderia ser difícil, sequer teria começado." Se não me engano, Albert Low falou algo deste calibre, no seu A vaca de ferro do zen.
O mesmo pode ser dito da vida. Se soubéssemos o quanto ela poderia ser difícil - cotidianamente, paulatinamente, excepcionalmente -, o quanto ela não cessa de nos mandar as benesses e as mazelas cotidianas, sem interrupção, acho que um bom número de nós escolheria, em algum momento, nem sequer ter aparecido - pensamento este evidentemente absurdo.
Tente imaginar que você jamais existiu. Não, não assim, não é pensar em você, seja o que for, olhando para o mundo sem a existência ______ (coloque o seu nome aqui); é pensar que você - que está pensando agora - sequer tenha experienciado um momento de consciência de si, e o mundo continuou. É praticamente inconcebível: podemos pensar a nossa não-existência - de modo até calmo e desapegado - somente se vemos com o nosso ponto-de-vista.
Não dá pra dizer "chega, pode parar" para a vida, por mais "vivido" que você pense estar. É tirar ou pôr. A vida é uma questão de vida ou morte, e não pensa em termos de excessos ou deficiências, de mais ou menos - "chega", "ainda não", "estou cheio/estou vazio".
Que pena. Queria uma banheira de água quente infinda, que não murchasse os dedos nem ardesse os olhos, com uma taça de vinho que não acabasse nunca e sempre mudasse a uva, a idade e o vinhedo, com direito a replay dos melhores momentos, sem ressaca. Ah, como eu queria.
E quando nos aproximamos do zen, e nele aprofundamos, e aprofundamos, e aprofundamos... haverá aí ainda alguma escolha? Essa é uma boa pergunta. Dizem por aí que o caminho da LIBERDADE é o de quem já não tem mais nada a perder.
ResponderExcluirSeigen,
ResponderExcluirme permiti uns tantos dias e noites para ficar com o teu comentário, não quis responder na hora.
No fundo eu não sei responder, mas é isto mesmo, ao que me parece. Eu não gosto disso, isso me deixa cansado - como você pode ver pelo post - mas fica ainda pior quando percebe-se que não é a "prática" que é assim, mas a própria vida. Se fosse a prática somente, haveria escapatória, e se a vida não o fosse - "insatisfatória", em outras palavras - não haveria necessidade para prática.
Parece que sempre voltamos para a pergunta dogeniana, no começo do Fukanzazengi: para que prática e verificação?
Parece que, realmente, não há escolha. Não é engraçado? E, desde sempre, não temos nada a perder; isto não é irônico?
Um dos "koans", das historinhas, que mais me incomoda é o seguinte: você é um rato que entrou em um pedaço de bambu, e fica preso: não dá para avançar, não dá para recuar. O que você faz?