Ligo a televisão, no quebrar da madrugada, para varar os olhos com imagens estalantes, e cansar os ouvidos com histórias cortadas pela metade. Uma emissora especializou-se em transmitir documentários americanos como se se tratasse da realidade do nosso país: ali eu paro. Falam sobre os centavos de dólar, os pennies: como cada penny custa quase o dobro para ser produzido - cada moeda sai por 2 centavos de dólar - e dos argumentos contra e a favor para se retirar os pennies - e talvez todos os centavos - de circulação na economia nacional (EUAense).
Por volta dos anos 80, talvez nos 70 do século passado, nasce um menino. Ele tem cabelos escuros, e um rosto redondo. Talvez tenha se interessado por números desde pequeno, talvez não; o que sei é que, muitos anos depois, ele vai estudar no MIT, o bom e velho MIT, o MIT de onde todos saem conhecidos e reconhecidos. Podemos imaginar as suas noites em claro, chafurdando em livros, olhos cansados na tela do laptop, muitas xícaras de café. Talvez namorasse um pouco, não sei dizer. Formou-se magna cum laude? Também não sei. Só sei que, na primeira década do século XXI, ele aparece em um documentário sobre os pennies americanos. Onde foi mesmo que eu escutei isto antes? Ah, lá em cima.
Bem, ele é a favor de tirar os pennies de circulação. Repasso seu argumento para aqueles que me leem: um americano médio espera, em média, o seu troco médio em centavos por médios 2 segundos. Somando em média para cada médio americano, temos uma média de 2 horas e médios 40 minutos por anos (médios, descontados os anos bissextos) de esperas medianas por trocos de centavos. Como time = money, se esta espera média de duas horas e 40' por ano for multiplicada pelo número médio de trabalhadores americanos empregados, pelo valor médio da hora de trabalho (17 dólares), temos aí um prejuízo médio da ordem de centenas de milhões, se não mais, somente para lidar com moedinhas de centavos.
Não é genial? Ele, certamente, poderia ser ainda mais genial se os americanos parassem de usar centavos e transferissem todo o dinheiro que deixam de movimentar para subsidiar mais pesquisas como a dele.
Como ele é um cara inteligente, ele comenta rindo: ah, é claro que gastamos muito mais tempo falando no celular ou passeando no parque. Para ajuda-lo um pouco, eu acrescento mais algumas coisinhas: esperando o sinal abrir, o elevador chegar, a descarga empurrar água abaixo a nossa contribuição pós-prandial, o tempo para chegar na maquinazinha de café ruim "espresso", dando bom-dia para a faxineira, amarrando o cadarço do tênis.
[A SuperInteressante, por sinal, veiculou umas duas páginas, semanas atrás, com justamente esta ideia: quanto tempo gastamos, em média, no total de uma vida média (=70 anos), fazendo as medianas coisas rotineiras, desde dormir (23 anos) até esperar páginas baixarem na internet (esqueci).]
Se você me leu até aqui - e de onde você tirou a paciência ou o interesse, eu não sei dizer -, gastou, em média, cinco minutos para faze-lo. Congratulações: você acabou de perdê-los. Poderia estar fazendo a economia norte-americana girar, no mundo ideal dos pensadores MITeanos. Se, todo dia, você gastar cinco minutos lendo pessoas como eu, lá se foram 30 horas e meia em um ano. Você pode trocar estes cinco minutos de leitura por cinco minutos de zazen. Cinco? Melhor: faça-o 40 minutos - 20 de manhã, 20 de noite, ou um somente, mais longo. Coisa fácil, de principiante, é o tempo que praticamos nas quartas e sextas na CZBF.
Você se surpreende com as histórias do Buda Xaquiamuni que sentou-se durante uma semana debaixo da figueira? Bem, imagine-se você sentado por dez dias: isto é você, com os 40 minutos acima, por um ano - médio.