sábado, 26 de setembro de 2009

अनिच्चा


foto de Clark Little

A transitoriedade dos fenômenos não é ponto de chegada, mas sim ponto de partida da reflexão.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Nós continuamos tentando


II.46. sthirasukham āsanam

"Āsana: estar firmemente estabelecido em um espaço 'feliz'" (segundo a tradução muito bonita de Gérard Blitz).

sthira: firme, sólido, durável
sukha: bem-estar (felicidade)
āsana: postura

"Āsana: être fermement établi dans un espace heureux" (selon la très belle traduction de Gérard Blitz).

sthira: ferme, solide, durable
sukha: bonheur
āsana: posture

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Mora na filosofia

(....) Vou, então, responder ao teu problema, mas não sem que antes te aconselhe como deves moderar esse apetite ardente de que te vejo possuído, não vá ele, em vez de benefício, ser nocivo à tua formação. Repara que as questões não devem ser estudadas desordenadamente, nem convém tentar abarcar tudo de uma só vez; é gradualmente que chegarás à totalidade de nossas teorias. Importa também que não te esforces para além das tuas capacidades, nem tentes abarcar mais do que a tua preparação de momento te permite. Em suma, consagra-te ao estudo, não de tudo quanto te interessa mas sim de tudo quanto estás habilitado a entender. Se não desanimares, virás a conhecer tudo que desejas, pois quanto mais conhecimentos o espírito absorve tanto mais capacidade vai adquirindo.

Ainda guardo na memória um preceito que ouvi a Átalo nos tempos em que frequentava a sua escola (onde eu era sempre o primeiro a chegar e o último a sair); até mesmo durante os passeios do mestre eu o aliciava à discussão de um ou outro problema, aproveitando-me do facto de ele estar sempre pronto a ir ao encontro dos interesses dos seus discípulos. Dizia Átalo que "o docente e o discente se devem unir num propósito comum: o primeiro, ser útil ao discípulo, o segundo, tirar benefício do convívio com o mestre." [sic] De facto, quem convive diariamente com um filósofo obtém sempre algum benefício: ou o seu caráter se aperfeiçoa, ou se torna mais apto a aperfeiçoar-se. O poder da filosofia é tal que beneficia inevitavelmente não só os iniciados, mas até os que a conhecem ocasionalmente. Quem se põe ao sol, ainda que não seja essa a intenção, acaba por ficar bronzeado; a quem entra numa perfurmaria e lá se demora algum tempo comunica-se-lhe um pouco do cheiro característico do local; do mesmo modo, quem convive, mesmo distraidamente, com um filósofo aprende sempre qualquer coisa de útil. Repara que eu digo "convívio distraído", e não "hostilidade preconceituosa". [Negrito meu]

"Essa está boa! Se calhar não conhecemos casos de frequentadores, e por muitos anos, de escolas filosóficas que nem superficialmente sofreram a mínima influência!" [sic] Claro que conhecemos frequentadores obstinados e assíduos, até; mas a esses chamo eu "hóspedes" dos filósofos, não "discípulos". Há quem vá à escola apenas para ouvir, mas não para aprender, tal como se vai ao teatro pelo prazer de escutar um belo discurso, uma bela voz ou uma bonita peça! Uma grande parte dos frequentadores das escolas filosóficas vai lá apenas para passar o tempo. Não o faz para aprender a defender-se de algum vício, para interiorizar alguma lei moral que conduza ao aperfeiçoamento do caráter; vai lá apenas pelo prazer de ouvir. Várias pessoas levam consigo o bloco de apontamentos, para anotar, não pensamentos, mas frases que depois repetem sem proveito para ninguém, do mesmo modo que as ouviram sem proveito próprio. Algumas contudo, entusiasmam-se com as máximas sublimes, ficam mesmo inflamadas, de rosto e de espírito, de paixão pelos oradores, numa excitação semelhante ao efeito das flautas sobre os eunucos frígios, que ficam fora de si como se por ordem divina. A tais pessoas, o que as arrebata e excita é a beleza dos pensamentos, e não a harmonia de palavras ocas. Ao ouvir uma enérgica dissertação contra o medo da morte ou uma corajosa diatribe contra a fortuna sentem de imediato o desejo de pôr em prática o que ouviram.
(Lúcio Aneu) SÊNECA, o novo; Cartas a Lucílio, carta 108, tradução portuguesa de J. A. Segurado e Campos

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O desafio - ocidental - do lótus

Com a prática do zazen acabamos, de um modo ou de outro, tendo um conhecimento amador de biomecânica. Especialmente se você é uma pessoa com tendências a pensar obsessivamente, como eu. Ficar analisando os vetores durante o zazen não é zazen.

Com o tempo, também, torna-se evidente que a maior parte dos problemas "físicos" que temos durante o zazen é por causa da postura, da "má" postura. É evidente que a postura corporal e a "mente" estão de alguma forma relacionados, e podemos deduzir algo da cabeça de alguém, por exemplo, na sua postura do zazen.

Tem gente que diz que, dependendo do lado do corpo, pode estar relacionado com um aspecto da vida, profissional, amoroso. Agnosticamente não sei. Até mesmo a especialização hemisférica do cérebro está relacionada mais com aspectos cognitivos do que posturais. Há dados anedotais interessantes, porém, como a idéia - ainda não se se real - que quem se perde em um deserto, sem saber orientar-se, anda em círculos, pois um lado do corpo "puxa" mais que outro. No meu caso eu tenho certeza que seria assim, pois de saída tenho uma perna um pouco mais longa. Outro: vê-se que as pessoas em um quadro esquizofrênico cambaleiam mais para um dos lados, se não me engano o esquerdo.

Por "má" postura não queremos dizer que, necessariamente, a sua postura é ruim durante o cotidiano: pode ser, em muitos dos casos, mas não necessariamente. Cada caso é um caso, e cada um tem os seus problemas; uns originados pelo trabalho físico, outro por 8 horas por dia diante do computador, outro por problemas de saúde.

Imagine o que umas poucas horas na mesma postura, com o ombro direito levemente puxado para a frente, por causa da mão que segura o mouse, deve fazer. Assim, exatamente como estou agora.

Mesmo, porém, sendo você a Sophia Loren, pode não ter uma boa flexibilidade na parte mais importante para um boa postura no zazen: os quadris.

No final das contas, os quadris são o elemento crucial para a famosa e terrível e assombrosa postura do lótus (completo), a padmāsana do yoga, 結跏趺坐 (kekkafuza) nas palavras de Dōgen zenji; a postura mais estável possível. Como no zazen procuramos a postura ereta - ombros e orelhas na mesma linha, nariz e umbigo na mesma linha - pelo maior tempo possível, sabemos por experiência que a postura faz a diferença.

E, também, a postura do lótus é belíssima.

Sentar na postura do lótus não é puxar os pés para que fiquem engatados acima da coxa. Isso é o que a maioria das pessoas tenta fazer para mostrar o lótus, e dependendo da flexibilidade - no joelho, calcanhar - funciona melhor para uns, não muito para outros. Não é preciso dizer que somos idiotas se tentarmos forçar deste modo, o joelho é uma articulação rancorosa e não perdoa.

Está tudo nos quadris. Mulheres têm mais facilidade por ter um quadril diferente dos homens.

Mas isto não vale somente para a postura do lótus. Se valesse, eu não estaria dizendo nada dela aqui, pois pouquíssimos são os que a utilizam. Quase todas as posturas que utilizamos durante o zazen exigem uma abertura dos quadris, e a boa postura depende disto, de uma boa base. Se não houver esta boa base - se há algum desnível, um lado que escorrega mais, uma perna mais tensa - toda a postura sente.

Yōkō proporciona, todos os dias de prática de zazen, umas duas horas antes (17:30), algumas posturas de yoga para melhorar a postura do zazen. Todos estão convidados a fazer uma visita.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Chega

"Se você soubesse, de antemão, o quanto a prática ['espiritual', do zen] poderia ser difícil, sequer teria começado." Se não me engano, Albert Low falou algo deste calibre, no seu A vaca de ferro do zen.

O mesmo pode ser dito da vida. Se soubéssemos o quanto ela poderia ser difícil - cotidianamente, paulatinamente, excepcionalmente -, o quanto ela não cessa de nos mandar as benesses e as mazelas cotidianas, sem interrupção, acho que um bom número de nós escolheria, em algum momento, nem sequer ter aparecido - pensamento este evidentemente absurdo.

Tente imaginar que você jamais existiu. Não, não assim, não é pensar em você, seja o que for, olhando para o mundo sem a existência ______ (coloque o seu nome aqui); é pensar que você - que está pensando agora - sequer tenha experienciado um momento de consciência de si, e o mundo continuou. É praticamente inconcebível: podemos pensar a nossa não-existência - de modo até calmo e desapegado - somente se vemos com o nosso ponto-de-vista.

Não dá pra dizer "chega, pode parar" para a vida, por mais "vivido" que você pense estar. É tirar ou pôr. A vida é uma questão de vida ou morte, e não pensa em termos de excessos ou deficiências, de mais ou menos - "chega", "ainda não", "estou cheio/estou vazio".

Que pena. Queria uma banheira de água quente infinda, que não murchasse os dedos nem ardesse os olhos, com uma taça de vinho que não acabasse nunca e sempre mudasse a uva, a idade e o vinhedo, com direito a replay dos melhores momentos, sem ressaca. Ah, como eu queria.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Uma história de meditação bem-sucedida


Dolce far Niente, John William Waterhouse

Existe uma coisa chamada "análise do discurso", uma ou várias técnicas, com vários referenciais teóricos, para, por exemplo, analisar representações sociais em pedaços de discurso - textos, vídeos, músicas. Há trabalhos interessantíssimos, e aponto para o LACCOS, aqui na UFSC. Há, também, trabalhos risíveis, daqueles que se pergunta se foi realmente necessário uma pessoa chegar até um mestrado, ou doutorado, para escrever algo que, usualmente, as pessoas fazem - ou tentam fazer - lá na redação do vestibular, ou numa mesa de bar, ou em um blogue.

Uma destas análises risíveis segue-se abaixo.

Faz mais de duas semanas em que o seguinte blogue está assombrando a minha caixa de mensagens do gmail, lá em cima, onde o onipresente google coloca os seus pequenos anúncios. É um blogue de um cara de meia-idade, que poderia ser chamado, aqui no Brasil, de Ricardo da Silva.

Primeiro ponto: como ele mesmo diz, é um cara "normal", que descobriu uma técnica de meditação legal ("cool"), e que quer dividi-la com o mundo. Que maravilha! Não é mais necessário ter de apresentar mulheres bonitas sentadas em poses "de meditação" estapafúrdias, em lugares bucólicos ou em flats com cortinas de algodão fino sendo balançadas pelo vento. Afinal de contas, mulheres "bonitas" não existem em todos os lugares, nem todas as mulheres são "bonitas" e magras e flexíveis. Agora podemos virar a mesa e simplesmente ser uma pessoa "normal", com seus problemas de meia-idade ou demais. Afinal de contas, a maioria de nós é feita de pessoas "normais".

O blogue apresenta apenas um único texto, onde o Cado - vamos chamá-lo assim - conta a sua história com métodos de meditação, e o seu crescente desapontamento com eles. Lá em 2007 ele estava muito estressado e praticamente a ponto de ter um colapso nervoso; um dos médicos indicou a meditação e relaxamento como uma forma de lidar com o estresse. Cado foi atrás de vários métodos meditativos "estranhos e maravilhosos" que prometiam fazer maravilhas ("weird and wonderful meditation systems that promissed the earth"), e gastou por volta de 3000 dólares nisto. Alguns métodos exigiam 3 a 6 horas de prática por dia, e ele não podia, evidentemente, pois tinha que trabalhar e ganhar seu sustento.

Segundo ponto: Cado é uma pessoa normal que ficou em um estado de estresse agudo, como muitos. Todos sabemos que o estresse é, praticamente, uma das síndromes atuais. E Cado, evidentemente, faz o que é esperado: vai atrás de um médico, que além de lhe receitar alguma coisa (que Cado não quer tomar, pois não gosta de ter de tomar remédios), orienta para uma prática de "meditação"; Cado gasta uma graninha com métodos que prometiam o que ele queria, mas não cumpriam, ou exigiam demais. É um discurso parecido com o das pessoas que faziam parte de seitas ou de algumas igrejas atuais, e saíram ("dei todo meu dinheiro para Jesus e não ganhei nada"). Este é um dos pontos nodais do argumento dele, para o qual ele volta, mais tarde: "não gastem o dinheiro que eu gastei, façam como eu, vão direto para o que funciona".

Felizmente, então, Cado se defronta com uma técnica "baseada cientificamente", do qual ele falará mais adiante, que oferece os benefícios de uma prática de meditação profunda, mas mais rapidamente e com um custo menor, o Brainwave Entrainment, que, além de tudo, é validado cientificamente.

Terceiro ponto: "sempre me sinto mais confortável quando cientistas validam algo", diz Cado. É o que chama a sua atenção e o que demole um pouco do seu ceticismo frente a um método que é rápido e barato. Os cientistas e a ciência dão o ok e asseguram um status; este é um poder que grande parte das pessoas mais ou menos instruídas - eu incluso - dão aos mesmos, e que não se baseia em raciocínio ou intelecto ou discussão, mas somente em confiança de que alguém já fez o trabalho intelectual pela gente.

Cado segue contando um pouco de como chegou a conhecer este método novo de meditação, do seu ceticismo inicial até o momento em que ele, recebendo pelo e-mail, sem o pedir (spam anyone?) uma amostra grátis deste método, dá uma chance, mais pelo fato de que o "cara" que enviou esta amostra, um tal de Michael Mackenzie, foi quem deu - por e-mail - umas das dicas mais "honestas, gentis e gratuitas" sobre meditação.

Quarto ponto: carisma. Cado simplesmente confiou no Michael ("I guess I just trusted him at a gut level"). Apesar do aval científico, Cado não teria dado uma chance se este cara não tivesse surgido.

Então ele tenta, e coisas maravilhosas acontecem; seu estresse simplesmente evapora, depois de sete minutos, e ele descobre algo que realmente funciona. Pequeno parágrafo de explicação científica, e outros descrevendo os benefícios. Cado sugere que pessoas que praticam meditação durante anos a fio podem nunca experimentar estados tão bem-aventurados, e se sente em uma desvantagem desleal com todas estas pessoas que "gastam várias horas, por dia, sentadas disciplinadamente em posição de lótus".

Quinto ponto: Cado coloca, de um lado, a prática "árdua" de meditação, como usualmente a conhecemos - disciplina, horas e horas, dinheiro gasto - e faz o contraste com esta técnica, recém-descoberta, que exige pouco tempo, não custa tanto, e, por incrível que possa parecer, funciona. Do ceticismo ao convencimento, em poucos minutos; Cado é convencido que realmente funciona. Como Cado percebe que a prática árdua de meditação talvez não pareça proporcionar estes efeitos...

As pessoas perguntam qual o segredo de tal mudança, ele fala de tal método, e se sente feliz em poder ajudar as pessoas; é o melhor presente que ele pode dar ao mundo.

Sexto ponto: ...ele se sente feliz em poder ajudar os outros com a sua descoberta de algo mais simples e rápido. Cado não somente encontra algo que resolve o seu problema, mas também quer que os outros se beneficiem dele.

Nos últimos parágrafos, ele simplesmente resume alguns dos pontos levantados acima: "se você quer experimentar os vários benefícios extraordinários da meditação, sem todo o trabalho duro e os anos de dedicação, Brainwave Entrainment é uma excelente maneira de fazer isto. Eu te digo: a meditação Lifeflow lhe trará resultados mais rápido do que qualquer outra coisa que eu possa ter experimentado. Desde que eu comecei, descobri que esta técnica é a tecnologia mais avançada disponível agora. Se você der uma olhada, você vai descobrir os mesmos fatos.

Eu adoro ajudar as pessoas a derrotar o estresse e a sentir maior paz interior e felicidade. [....] nem toda meditação é trabalho duro e requer a paciência de um santo."

Ou: meditação rápida, barata, que tem bases científicas, e funciona - faz com que você tenha mais calma, segurança, paz e felicidade, sem ter que esperar muito, ou pagar muito, ou os dois, por isto. Meditação para pessoas normais, que não podem gastar o seu tempo e o seu dinheiro atrás de práticas difíceis - já que as outras práticas meditativas sempre exigem um tempo, dinheiro e uma dedicação que você não tem, preocupado em simplesmente ser um cara normal, que tem de alimentar a família.

Ou: meditação rápida e barata que te dá exatamente aquilo que você quer dela.

Isto é apenas o começo. A página do Brainwave Entrainment ou Lifeflow® é uma mina de ouro, em vários sentidos.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

A falta que um tenzo me faz...

Não, não estou falando de amores com um tenzo ou uma tenza, cortando cenouras à luz do luar. Conversava, isto sim, com um amigo, que me dizia do nosso próximo apascentamento da mente, sesshin, no meio de outubro, na já conhecida sede dos Baha'i. Sesshin neste lugar implica, automaticamente, em duas coisas: aranhas perigosíssimas nos quartos (aquelas marronzinhas), e comida feita por nós.

Este é algo que eu sempre sinto falta, quando ele não está presente. Em alguns lugares nos quais fizemos sesshin a comida era feita pelo pessoal da casa, e a cozinha ficava com eles também. Ajudávamos a arrumar as coisas, e nossos detalhezinhos ficavam por nossa conta, mas a maior parte do trabalho - preparação, cardápio, sobras, ingredientes, arrumação - eram eles quem faziam. E faziam bem: a comida sempre foi muito boa, nada do que reclamar, a não ser um arroz mal-cozido quando em vez.

Mas... não sei, pode ser besteira minha; a cozinha, porém, é vital. Um sesshin que também implica a cozinha - e tenzo, jonin, etc - fica mais redondinho. Por uma razão muito simples: a relação outros e nós mesmos.

Nós não vamos a um sesshin apenas para sentar em zazen, e por lá ficar. O sesshin é um momento de concentração, de reunião, da mente/coração. Isto implica um momento em que nos damos ao luxo de poder somente fazer zazen, claro, mas também implica outra coisa: trazer todas as nossas atividades para dentro desta reunião, e trazer todas as pessoas para dentro desta reunião. O fulano que não está fazendo zazen pois está lá embaixo, cortando cenouras, está praticando conosco. Ele teve de se levantar, enquanto os outros continuavam o seu zazen, para cortar cenouras - e cortar cenouras "como se fossem os seus próprios olhos", como dizia Dōgen, a respeito do cuidado a ter com os instrumentos e ingredientes.

E, é claro, tal fulano pode adorar isto e rezar para ser chamado para ser jonin. Isto não tem importância, há momentos de ser jonin, há momentos de reza, há momentos de zazen.

Não se trata da comida. Algumas comidas, evidentemente, são melhores para passar horas sentado-no-mesmo-lugar que outras. Sobremesas superdoces são terríveis para gente magra como eu. O pessoal no Busshinji comia uma quantidade que me faz passar mal mais de uma vez, quando eu fui jonin e não podia escolher o tamanho da minha porção. Os cinco sabores e cores devem estar presentes, e tudo e tal, mas comemos papa de aveia, se preciso. Água quente, se preciso. Sucrilhos com casca de ovo. Feijão com garapa. Risoto de jabuticaba.

Não é a toa que o trabalho da cozinha exige que o tenzo seja um dos seis cargos mais "importantes" de um mosteiro, e seja dado a um praticamente mais comprometido, ou um mestre, quando o há. Simplesmente não me soa "bom" ver a cozinha como apenas um lugar para cozinhar as coisas, para dar comida aos praticantes que estão no honorável zazen. A segunda parte é hábil, e deve ser a mente de um tenzo ("afinal, não é maravilhoso poder dedicar o que cozinhamos a verdadeiros praticantes do caminho?" - "é como se estívessemos oferecendo comida a todos o budas, patriarcas e seres"); mas a primeira não me parece. É colocar o zazen como um "fim" que deve ser atendido por um "meio" - cozinha, banheiros, almofadas, camas; uma distinção desnecessária.

Cozinhar nós mesmos nossa própria comida nos ajuda a lembrar disto. E, quando outrem o faz, nós comemos agradecidamente, (tentando compreender) compreendendo o vazio das Três Rodas: quem dá, quem recebe e a própria oferenda.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Deixe eu e o mundo sermos como somos.
Não há coisas, nem há vazio.
Se há coisas, não são para mim.
Se não há nada, eu não o quero.
Não sou Manjushri ou algum "sabichão".
Sou um homem comum que faz o que tem que fazer.
Quão simples é a verdade!
Nos sentidos, pensamentos e sensações jaz verdadeira sabedoria.
Tudo é Um com a Unicidade.
Aquele que alcança não é dois.
Se queres ficar livre do sofrimento e viver no saber,
Eu não posso te dizer onde fica a terra de Buda.

P'ang Yun (龐蘊), o Leigo (740-808 dC)
em Pensando zen: a vaca de ferro do zen, de Albert Low, ed. Bodigaya.

terça-feira, 1 de setembro de 2009


Do alto deste Everest, um pequeno buda vos contempla.